sábado, 6 de março de 2010

L-O-V-E!

Tirou todas as suas coisas dos bolsos – e do coração – e colocou sobre a mesa. Havia milhares. Tantas que mal podia contar. Tentou dar a merecida atenção para cada uma delas, manuseando-as e observando-as com atenção antes de separá-las em duas categorias:

As dispensáveis e as indispensáveis.

O lado das dispensáveis, que acabariam sendo jogadas no lixo e levadas para longe por pessoas desconhecidas, virou um enorme bolo de coisas inúteis. Um punhado de papel de balas de iogurte, anotações inúteis de anos atrás. Rostos quase desconhecidos que apenas ocupavam espaço em sua mente. Lembranças que não precisava mais. Aquele professor chato de física.

Vasculhando, sentiu nos dedos algo viscoso. Pegajoso. Grudou em suas mãos e subiu rapidamente por seus braços, encobrindo-lhe o corpo e o deixando de uma cor cinza. Antes que um segundo se passasse, dominava-lhe por completo. Trazia uma sensação de conforto e vazio.

A raiva, o medo e o rancor. A vingança.

Havia algo de sádico e masoquista em como aquilo lhe corroia o estomago e, ao mesmo tempo, parecia-lhe tão indispensável. Como se já fizesse parte de sua existência. Foi então que sentiu um gosto amargo e forte, como o pior dos remédios. Óbvio. O inconfundível gosto do medo. Tentou cuspi-lo, mas estava tão grudado em sua existência quanto os sentimentos anteriores.

Encorajou-se pelo gosto amargo e decidiu:

Aquilo tudo deveria ir parar na lixeira.

A segunda parte não era um bolo – e nem era enorme. Uma pequena pilha cuidadosamente arrumada numa organização perfeita. Envolvidas por uma camada fina – mas sincera e forte – de carinho e preocupação, as coisas que decidira como sendo indispensáveis para sua existência. Havia um lápis e um pequeno bloco de anotações. Um pequeno grupo dos familiares mais próximos. Os amigos – amigos, e não os colegas. Havia um punhado de músicas, artistas e filmes. Alguns livros também. Um grupo de sentimentos e algumas lembranças

Quando ergueu a mão para a coisa seguinte, sentiu algo queimar seus dedos. Largou rapidamente e viu o punhado vermelho brilhante se destacando na mesa. Tão atraente. Por um momento, sentiu aquele gosto amargo novamente. Mesmo assim, estendeu a mão e tocou a coisa outra vez. Dessa vez, não queimou. Envolveu e aqueceu seus dedos tranqüilamente, mas não subiu para envolver todo seu corpo. Deixou-lhe a escolha.

O amor.

Não era típico dele se impor. Sempre deixava a escolha. E ela, por um momento, sentiu o impulso de jogá-lo rapidamente para o amontoado das coisas inúteis. Não queria aquela coisa estranha que não conseguia entender. Sem ter coragem de jogá-lo fora, brincou com ele entre os dedos por alguns instantes. E sentiu vontade de rir. No final das contas, tentava entender. O que era aquilo? Às vezes, esquentava um pouco demais. Ardia e doía. Chegava a machucar. Mas, no instante seguinte, confortava. Era confuso. Durante aquele pouco tempo, quis livrar-se dele inúmeras vezes. Toda vez que ele machucava, sentia-se tentada a jogá-lo longe e esperar para vê-lo sendo arrastado para longe – bem longe. Mas alguma coisa não permitia.

Aquela duvida durou tanto tempo que não pôde contar. Por fim, cansada e cheia daquelas queimaduras, desistiu.

– Desculpe-me.... – Murmurou para si mesma.

Ou para o amor? De qualquer maneira, não o colocou em nenhuma das pilhas. Optou por colocá-lo direto no peito. No coração. Por algum motivo, ele merecia aquilo.

– ...Eu não posso desistir de você.

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